Sentimentos passados (III)...

Depois de ter estado com o R. na sala de espera, a enfermeira voltou para me ir buscar. Segundo ela, não podia estar lá fora. Levei comigo a mala com a roupa que o Diogo iria vestir ao nascer, mas nem nisso fui poupada... - "O quê?! É só isto o que traz para o bebé?! (segundo o que me disseram no Centro de Saúde e por as maternidades serem muito quentes, bastava levar como primeira roupa um bodie, uma fralda, umas meias, um gorro, uma fralda de pano e uma mantinha para enrolar o bebé.) Então o fatinho? O babygrow?!" - E eu, já cansada de dores e de me sentir enxuvalhada q.b., apenas lhe disse, mostrando o panfleto do Centro de Saúde que estava na mala, que tinha sido o aconselhado nesse local. De imediato, vendo-me já aborrecida me disse que a culpa não era minha sendo assim, mas que eu "devia saber que o bebé precisa de ser mais vestido para não ter frio!". Saíu, dizendo que ia pedir ao R. para ir buscar um babygrow para o bebé. No tempo que fiquei a sós novamente, tive uma quebra de tensão pelas dores intensas e pelo calor que se fazia sentir no Bloco de Partos. Nem sei como não desmaiei, sinceramente. Consegui chegar à casa de banho, molhei o rosto numa tentativa de me conseguir aguentar consciente e de repente, vem-me o vómito à boca e zás; sanita com ela! Nem sei como consegui fazer pontaria, palavra de honra... cada vez com contracções mais dolorosas, tensão a descer rapidamente, o calor abrasador que sentia e o tratamento "5 estrelas", estavam a deixar-me física e psicologicamente de rastos...
Quando a enfermeira voltou, disse-me que iriamos para a sala de parto, de modo a me ser colocado o soro e o CTG, para a contagem decrescente. E foi aí, que não aguentei mais as dores... nunca pensei conseguir passar por tantas dores e mesmo assim sobreviver. Nunca pensei que com tantas dores e por eu gritar por isso, alguém fosse capaz de me dizer - "Tanta gritaria! Continue assim e o pai fica lá fora!", nunca pensei que ao pedir a epidural, alguém me desse um documento a explicar o que era, como se administra e para assinar, e ficar com esse documento na mão a pedir uma caneta para autorizar a administração da droga, sem ninguém me responder. Jamais pensei que me iam dizer - "Não pode levar a epidural, qual epidural qual quê! Já está a fazer a dilatação depressa demais, já vai tarde para isso!"... E com isto, sei que ela colocou-me Petidina em conjunto com o soro de modo a acelerar as contracções, com isto sei que vomitei novamente, com isto sei que me colocaram a máscara de oxigénio por o Diogo estar em sofrimento e com isto, devido à Petidina e apesar das contracções que estava a sentir de 30 em 30 segundos, acabei por fechar os olhos, acabei por me deixar levar pelo cansaço ao ponto de só me lembrar de ter perguntado, - "Ainda falta muito? O meu marido? Onde está o meu marido...?" e de me terem respondido, - "Já está quase, o seu marido já vem." - E caí para o lado, literalmente.
O R. apareceu por volta das 7h30. A mudança de turno deu-se e com isso a primeira enfermeira foi embora; apenas ficou a enfermeira dos documentos assinados. Lembro-me de ter escutado de olhos fechados uma voz baixinha a dizer: - "Pode entrar, está ali uma cadeira, sente-se lá que ja está quase." - e abri os olhos. Vi o R. todo vestido de verde, bata e pantufas (muito sexy, lol) e agarrei-me à mão dele. - "Não aguento mais, amor...! Não aguento..." - as contracções iam e vinham a uma velocidade alucinante, estava mais tempo com dores do que a descansar. Quando olhei para o frasco da Petidina, este já estava vazio e a densidade das contracções aumentou, aumentou tanto que gritei, gritei! O CTG começa subitamente a apitar "Pip-pip! Pip-pip!" e fez com que uma enfermeira viesse a correr à sala, o coração do Diogo não se ouvia e forçaram-me a ficar de barriga para cima de modo a colocar o aparelho de forma a escutá-lo. Mas não aguentei. Mesmo contrariando a enfermeira, virei-me para a direita e assim fiquei, de mão dada com o R. e de costas para ele. Até que, no meio de tanta contracção, me deu uma vontade enorme de fazer força, muita força. Uma médica entrou e pede-me para fazer precisamente o contrário. Tentei fazer o que me era pedido... mas não consegui, era mais forte do que eu... e lá começou o processo de expulsão. A médica e enfermeira pediram-me para colocar as pernas nas perneiras, pediram-me para agarrar umas pegas abaixo das perneiras e fazer o máximo de força possível. Assim fiz, quase sem forças, com o R. a fazer-me festas no cabelo, fiz a maior força que fui capaz até que ouvi, - "Não faça força agora! O bebé tem o cordão no pescoço!". Parei a custo, mas aquelas palavras alarmaram-me. Por mais vontade que tivesse de fazer força, aguentei pelo meu filho e... escutei o seu choro pela primeira vez, eram 8h30 da manhã. Vi-o, um pouco cinzentito, pequenino a chorar. Perfeito e lindo como nenhum outro. Foi colocado no meu colo por 5 segundos, não mais que isso. Apenas consegui tocar-lhe ao de leve na cabeça antes daquela besta de enfermeira dizer "Agora vou pesá-lo e vesti-lo, já vai ter muito tempo para estar com o bebé. Ai que branco que ele é!" - Ignorei-a o mais que pude, com o coração nas mãos por não ter sequer falado com o meu filho, não ter sequer pegado nele, nem dado de mamar. Mandaram o R. sair depois de me terem cozido, altura em que tremi como nunca tinha tremido antes. Sentia tanto frio... estava com a alma pequenina, estava ali, ao lado de um dos homens da minha vida, enquanto o outro não o vi depois de vestido. Mas irei recordar sempre, o R. do meu lado quando colocaram o Diogo no meu colo, com uma lágrima nos olhos por ter visto o filho nascer. Jamais esquecerei esse momento.
Depois disto, pediram-me para passar para uma cama e fui posta num quarto (se é que se pode chamar aquilo de quarto), ainda sem o meu filho. Perguntaram-me se queria beber alguma coisa, recusei. E adormeci por breves momentos, completamente exausta. Quem me acordou foi uma enfermeira, - "Acorde mãe, quer dar de mamar ao seu bebé?" - e ao abrir os olhos, vejo o meu pequenino, lindo, a ser colocado do meu lado para mamar pela primeira vez, eram 10h30m. E, podendo parecer fria aos vossos olhos, não sei se me estava a sentir feliz. Era uma realidade muito repentina para mim. Depois de tudo o que passei, tinha um ser dependente de mim e as dúvidas assombravam-me a mente a toda a hora. Aquele trabalho de parto havera-me enfraquecido o corpo, mas também a mente. Tudo o que tinha aprendido acerca da maternidade, durante os tempos da gravidez, estava como que a desaparecer com a insegurança que estava a sentir. Ainda me sentia a menina mal comportada que tinha sido castigada com palavras de apreensão e dores físicas propositadas. Estava assustada, passou-me pela cabeça que talvez não fosse capaz de tomar conta do meu filho. O meu filho deve ter mamado apenas cerca de cinco minutos. O tempo passou muito depressa e quando dei por mim, estava com o Diogo do meu lado e a ser levada sei lá para onde. Vi o R., à saída do Bloco de Partos. Só teve tempo de me dar as malas e eu de lhe dizer para avisar os meus pais. Nem um beijo lhe dei...
Fui deixada num quarto com duas mães que iam ter alta nesse dia, mas não falei com ninguém. A enfermeira que me acompanhou (uma das duas únicas enfermeiras afáveis e competentes que encontrei) deitou o Diogo no berço junto à minha cama, perguntou se eu queria beber alguma coisa, e disse-me que eu faria o recobro por volta das 14h30. E deixou-me ali. Mas não consegui descansar; limitei-me a contemplar o meu filho, de rosto redondo e perfeito, calmamente a dormir como se não tivesse passado por nada daquilo. Toquei-lhe na mão pequenina e sorri para mim mesma. Foi o que de melhor fiz na minha vida, não tenho dúvidas. As mães saíram na hora de almoço, pouco antes de me trazerem um tabuleiro de comida abominável. Limitei-me a comer a sopa e a beber água. Deixei o prato principal e a fruta. Adormeci. Acordei com uma enfermeira a perguntar se eu já tinha dado de mamar, respondi que não, pois não tinha forças para me levantar e pegar no bebé. A enfermeira ficou a refilar enquanto colocava o bebé do meu lado e saíu assim mesmo, a refilar entre dentes. Mas o Diogo não mamou... continuou a dormir e por mais que eu lhe tentasse dar mama, ele limitava-se simplesmente a continuar adormecido. Comecei a ficar preocupada, até que veio a enfermeira para me fazer o recobro e descansou-me. Colocou o Diogo novamente no berço e disse para não me preocupar, que os bebés dormem muito e que quando ele tivesse com fome, que daria o alarme. Apenas para não deixar passar mais de seis horas sem mamar. Ajudou-me a levantar e levou-me até ao duche. Nunca me soube tão bem um duche! Quando voltei para o quarto, estava sózinha. Peguei no Diogo e fui até à janela. Queria tanto ver o R.... queria sentir algum apoio, queria repartir a alegria de ter o meu filho nos braços, sem ninguém a dizer-me que tinha de o levar não sei para onde.
Terminarei o relato amanhã, a um dia do meu filho completar 3 meses de vida e um ano na minha vida. Hei-de exorcizar os meus pensamentos e sentimentos passados antes dessa data e a partir daí, só coisas boas para relatar.
O R. apareceu por volta das 7h30. A mudança de turno deu-se e com isso a primeira enfermeira foi embora; apenas ficou a enfermeira dos documentos assinados. Lembro-me de ter escutado de olhos fechados uma voz baixinha a dizer: - "Pode entrar, está ali uma cadeira, sente-se lá que ja está quase." - e abri os olhos. Vi o R. todo vestido de verde, bata e pantufas (muito sexy, lol) e agarrei-me à mão dele. - "Não aguento mais, amor...! Não aguento..." - as contracções iam e vinham a uma velocidade alucinante, estava mais tempo com dores do que a descansar. Quando olhei para o frasco da Petidina, este já estava vazio e a densidade das contracções aumentou, aumentou tanto que gritei, gritei! O CTG começa subitamente a apitar "Pip-pip! Pip-pip!" e fez com que uma enfermeira viesse a correr à sala, o coração do Diogo não se ouvia e forçaram-me a ficar de barriga para cima de modo a colocar o aparelho de forma a escutá-lo. Mas não aguentei. Mesmo contrariando a enfermeira, virei-me para a direita e assim fiquei, de mão dada com o R. e de costas para ele. Até que, no meio de tanta contracção, me deu uma vontade enorme de fazer força, muita força. Uma médica entrou e pede-me para fazer precisamente o contrário. Tentei fazer o que me era pedido... mas não consegui, era mais forte do que eu... e lá começou o processo de expulsão. A médica e enfermeira pediram-me para colocar as pernas nas perneiras, pediram-me para agarrar umas pegas abaixo das perneiras e fazer o máximo de força possível. Assim fiz, quase sem forças, com o R. a fazer-me festas no cabelo, fiz a maior força que fui capaz até que ouvi, - "Não faça força agora! O bebé tem o cordão no pescoço!". Parei a custo, mas aquelas palavras alarmaram-me. Por mais vontade que tivesse de fazer força, aguentei pelo meu filho e... escutei o seu choro pela primeira vez, eram 8h30 da manhã. Vi-o, um pouco cinzentito, pequenino a chorar. Perfeito e lindo como nenhum outro. Foi colocado no meu colo por 5 segundos, não mais que isso. Apenas consegui tocar-lhe ao de leve na cabeça antes daquela besta de enfermeira dizer "Agora vou pesá-lo e vesti-lo, já vai ter muito tempo para estar com o bebé. Ai que branco que ele é!" - Ignorei-a o mais que pude, com o coração nas mãos por não ter sequer falado com o meu filho, não ter sequer pegado nele, nem dado de mamar. Mandaram o R. sair depois de me terem cozido, altura em que tremi como nunca tinha tremido antes. Sentia tanto frio... estava com a alma pequenina, estava ali, ao lado de um dos homens da minha vida, enquanto o outro não o vi depois de vestido. Mas irei recordar sempre, o R. do meu lado quando colocaram o Diogo no meu colo, com uma lágrima nos olhos por ter visto o filho nascer. Jamais esquecerei esse momento.
Depois disto, pediram-me para passar para uma cama e fui posta num quarto (se é que se pode chamar aquilo de quarto), ainda sem o meu filho. Perguntaram-me se queria beber alguma coisa, recusei. E adormeci por breves momentos, completamente exausta. Quem me acordou foi uma enfermeira, - "Acorde mãe, quer dar de mamar ao seu bebé?" - e ao abrir os olhos, vejo o meu pequenino, lindo, a ser colocado do meu lado para mamar pela primeira vez, eram 10h30m. E, podendo parecer fria aos vossos olhos, não sei se me estava a sentir feliz. Era uma realidade muito repentina para mim. Depois de tudo o que passei, tinha um ser dependente de mim e as dúvidas assombravam-me a mente a toda a hora. Aquele trabalho de parto havera-me enfraquecido o corpo, mas também a mente. Tudo o que tinha aprendido acerca da maternidade, durante os tempos da gravidez, estava como que a desaparecer com a insegurança que estava a sentir. Ainda me sentia a menina mal comportada que tinha sido castigada com palavras de apreensão e dores físicas propositadas. Estava assustada, passou-me pela cabeça que talvez não fosse capaz de tomar conta do meu filho. O meu filho deve ter mamado apenas cerca de cinco minutos. O tempo passou muito depressa e quando dei por mim, estava com o Diogo do meu lado e a ser levada sei lá para onde. Vi o R., à saída do Bloco de Partos. Só teve tempo de me dar as malas e eu de lhe dizer para avisar os meus pais. Nem um beijo lhe dei...
Fui deixada num quarto com duas mães que iam ter alta nesse dia, mas não falei com ninguém. A enfermeira que me acompanhou (uma das duas únicas enfermeiras afáveis e competentes que encontrei) deitou o Diogo no berço junto à minha cama, perguntou se eu queria beber alguma coisa, e disse-me que eu faria o recobro por volta das 14h30. E deixou-me ali. Mas não consegui descansar; limitei-me a contemplar o meu filho, de rosto redondo e perfeito, calmamente a dormir como se não tivesse passado por nada daquilo. Toquei-lhe na mão pequenina e sorri para mim mesma. Foi o que de melhor fiz na minha vida, não tenho dúvidas. As mães saíram na hora de almoço, pouco antes de me trazerem um tabuleiro de comida abominável. Limitei-me a comer a sopa e a beber água. Deixei o prato principal e a fruta. Adormeci. Acordei com uma enfermeira a perguntar se eu já tinha dado de mamar, respondi que não, pois não tinha forças para me levantar e pegar no bebé. A enfermeira ficou a refilar enquanto colocava o bebé do meu lado e saíu assim mesmo, a refilar entre dentes. Mas o Diogo não mamou... continuou a dormir e por mais que eu lhe tentasse dar mama, ele limitava-se simplesmente a continuar adormecido. Comecei a ficar preocupada, até que veio a enfermeira para me fazer o recobro e descansou-me. Colocou o Diogo novamente no berço e disse para não me preocupar, que os bebés dormem muito e que quando ele tivesse com fome, que daria o alarme. Apenas para não deixar passar mais de seis horas sem mamar. Ajudou-me a levantar e levou-me até ao duche. Nunca me soube tão bem um duche! Quando voltei para o quarto, estava sózinha. Peguei no Diogo e fui até à janela. Queria tanto ver o R.... queria sentir algum apoio, queria repartir a alegria de ter o meu filho nos braços, sem ninguém a dizer-me que tinha de o levar não sei para onde.
Terminarei o relato amanhã, a um dia do meu filho completar 3 meses de vida e um ano na minha vida. Hei-de exorcizar os meus pensamentos e sentimentos passados antes dessa data e a partir daí, só coisas boas para relatar.
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